segunda-feira, 7 de novembro de 2016

CAMÕES e FERNANDO PESSOA

Camões em Os Lusíadas mostra Vasco da Gama ameaçado pelo Gigante Adamastor, que representa o Cabo das Tormentas. Assim coloquei em minha adaptação: "Eu sou aquele oculto e grande cabo a que chamais vós outros Tormentório (. . . ) Aqui espero tomar de quem me descobriu suma vingança e não ficará só nisso o dano de vossa persistente confiança (. . . ) Fui um titã, chamava-me Adamastor." Só para dar uma pálida ideia. 

Agora vejam o que fez o genial Fernando Pessoa em seu livro Mensagem:


O MOSTRENGO

O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»

«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»

Esse poema é uma paródia no sentido literal grego da palavra, um canto paralelo, revelando uma forte intertextualidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário